segunda-feira, 7 de novembro de 2011

E a cada vez que, extasiado, perder-se no outro, pare...

Se obrigue a lembrar-se de sí.

Do contrário, nada vai durar.

sábado, 22 de outubro de 2011

No lugar certo

Acordei no meio da madrugada, sem sono. Olhei em volta e reparei na garrafa de água, que fica na prateleira mais baixa da porta da geladeira, em cima do criado mudo. Levantei, tomei um gole direto no gargalo, não a levei de volta para a cozinha. Deixei ali.

Fui até a cozinha e abri a geladeira: é o que se faz quando o sono vai embora, eu não queria beber nem comer nada. O suco - que fica na prateleira do meio da porta da geladeira, com a parte da frente virada para trás quando o suco está fechado e para frente quando está aberto - estava na prateleira de baixo, no lugar da água, com a parte da frente virada nem para trás nem para frente, mas para o lado. Estranhei.

Peguei o suco, coloquei um pouco num copo.(...) Devolvi a embalagem à prateleira de baixo da porta da geladeira, com a parte da frente virada para o lado. Enquanto bebia reparei que a escova de cabelos estava fora do banheiro, ao lado da tv da sala, que dava pra ver da cozinha. Voltei para o quarto e a deixei onde estava. A escova. A cozinha também.

Apaguei a luz e me deitei. Lembrei que a garrafa de água estava ali, em cima do criado mudo, fora do seu lugar de origem, ocupado pela caixa de suco virada para o lado errado, de onde dava pra ver que a escova de cabelos não estava no banheiro. Virei para o lado e dormi. Dormi muito bem.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

10:10

Certa noite, há pouco mais de um ano atrás, tive um sonho que não só me marcou como marcou uma transição definitiva no meu modo de pensar.

Antes de dormir combinei com meu pai que ele passaria em casa para me buscar as 10h da manhã do dia seguinte. Fui dormir e sonhei.

Sonhei que, no dia seguinte, acordei atrasado, 9:50h da manhã. Corri para o chuveiro e tomei - dentro do meu conceito - um banho rápido de cerca de dez minutos. Sai do chuveiro, me enxuguei, escovei os dentes, corri pela casa em busca de uma roupa que me agradasse, parte no armário, parte no varal. Fui me pentear e, neste dia em especial, meus cabelos resolveram demorar a aceitar uma forma minimamente civilizada.

Quando consegui algo próximo ao aceitável me apressei em colocar as meias e sentei-me no sofá da sala para calçar um par de tênis. Nesse instante, olhei para o relógio na parede ao lado que marcava 10:10h. Pensei aliviado que ele estava atrasado. Eu já estava pronto e agora só restava esperar. Respirei, aproveitei o tempo extra para brigar um pouco mais com o cabelo e dar uma fuçada na internet, sempre com o celular em mãos, preparado para parecer que eu estava preparado desde a hora marcada.

Cansado de matar o tempo livre, sentei-me novamente no sofá da sala para esperar e olhei o relógio de parede: 10:19h... quando é que ele chega? Vou dar mais um tempo e ligar. E então o celular toca, olho no relógio de parede antes de atender, 10:20h.

 - Alou... - digo simulando uma voz mais aguda, diferente da voz grave de quem acabou de acordar.

 - Pode descer que eu já to chegando na sua rua - diz ele. Desliguei o celular e acordei do sonho.

Como de costume, acordei atrasado, 9:50h da manhã. Corri para o chuveiro e tomei - dentro do meu conceito - um banho rápido de cerca de dez minutos. Sai do chuveiro, me enxuguei, escovei os dentes, corri pela casa em busca de uma roupa que me agradasse, parte no armário, parte no varal. Fui me pentear e, nesse dia em especial, meus cabelos resolveram demorar a aceitar uma forma minimamente civilizada.

Quando consegui algo próximo ao aceitável me apressei em colocar as meias e sentei-me no sofá da sala para calçar um par de tênis. Nesse instante, olhei para o relógio na parede ao lado que marcava 10:10h...

 - Impossível... - em um segundo veio à minha cabeça a lebrança de todo aquele sonho que acabara de ter. Até então não me lembrava dele - acordei daquele jeito meio capenga, meio com pressa que sempre tira da cabeça da gente qualquer sonho, instantaneamente. E no segundo seguinte eu tinha, não a sensação, mas a certeza mais absoluta e profunda que se pode ter de que meu celular tocaria em exatos dez minutos. Eu já estava pronto e agora só restava esperar.

 - Idiota, você deve estar delirando - disse a mim mesmo, mas fracassei na tentativa de abalar minha certeza naquilo que estava para acontecer. E então, por algum motivo desses que não me atrevo a tentar deduzir qual, minha mente bloqueou esse pensamento, o do sonho.

Levantei-me do sofá, respirei. Aproveitei o tempo extra para brigar um pouco mais com o cabelo e dar uma fuçada na internet, sempre com o celular em mãos, preparado para parecer que eu estava preparado desde a hora marcada. Cansado de matar o tempo livre, sentei-me novamente no sofá da sala para esperar e olhei o relógio de parede: 10:19h...

 - Porra! - Me arrepiei por inteiro diante do susto que me provocou a súbita retomada da lembrança daquele sonho. Fiquei ali, sentado. Congelado com o celular em mãos, diante da certeza do que viria a seguir. Era uma sensação estranha: ao mesmo tempo que estava aflito e paralisado com aquela incontrolável soberania sobre o tempo, sentia-me poderoso.

Hesitei por algum tempo em olhar o relógio. Olhei. O tempo parecia que não passava, 10:19h: cinquenta e quatro, cinquenta e cinco, cinquenta e seis, cinquenta e sete, cinquenta e oito, cinquenta e nove.... 10:20h, o celular toca:

 - Alou... - digo simulando uma voz mais aguda, diferente da voz grave de quem acabou de acordar.

 - Pode descer que eu já to chegando na sua rua.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Um homem saiu na rua, virou a esquina e tomou dois tiros na cabeça. Seu filho recebeu a notícia, saiu correndo, tropeçou e caiu de uma ponte. Morreu. A mulher que assistia se assustou. Enfartou. Morreu. O cachorrinho da senhora saiu correndo. Foi atropelado. Morreu. O carro que tentou desviar bateu na porta de um outro que vinha cruzando. Capotou três vezes. Morreu e matou o motorista do outro carro. Um chinês morreu. Não sei porque, mas com certeza um chinês morreu neste minuto. Um avião caiu. Todos morreram. Ele caiu no centro de São Paulo. Várias pessoas morreram também. Várias pessoas receberam a notícia das mortes. Várias enfartaram. Muitas se mataram. Algumas se revoltaram e saíram na rua atirando. A polícia não gostou. Saiu atirando também. A população se revoltou e começou a matar policiais e civis com tacos de basebol, canivetes, pedaços de pau, flechas envenenadas, lanças, arpões de pesca, pás, garrafas de vinho quebradas, alicates, cortadores de unha, vassouras, cadeiras, serras elétricas, mordidas. A notícia foi se espalhando e o mundo inteiro se matou. Acabou a raça humana. Fim.

domingo, 24 de julho de 2011

Ah, essa nossa mania de achar que interrogação é o mesmo que dois pontos parágrafo travessão....

E essa nossa mania?:
   - Ler interrogação
Transformá-la em dois pontos
Parágrafo, travessão....



而我們的熱潮?:
  - 讀標記
打開它兩點
段落,縮進....



E che la nostra mania?
  - Leggi marchio
Accenderlo due punti
Comma, trattino ....
 


Et quod INSANIO:
    - Read mark
Verto is ex duobus
Paragraph: indent ....



sábado, 9 de julho de 2011

Guarda-Chuva Colorido

Existe uma diferença entre as coisas que importam e as que não importam.

As coisas que não importam são aquelas às quais chamamos de "coisas importantes". Essas não importam. Elas são as coisas das quais ouvimos falar, nas quais somos estimulados a interferir, aquelas que estão na boca do povo, aquelas que estão na boca das elites, aquelas que estão na boca de políticos, jornalistas, ambientalistas, médicos, empresários, fanáticos.

As coisas que importam são aquelas que conversam com você. Que ao perguntar-se o por quê de estar fazendo ou pensando em algo, você não acha resposta. Aquelas que não importam para a humanidade, ou para a história, ou para a família, amigos, chefes, namoradas, vizinhos ou quem quer que seja. Hoje eu tenho um guarda-chuva colorido que comprei no farol. É isso - e apenas isso - que, agora, importa.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Se eu parar pra pensar, tudo parece uma merda. Então é melhor pensar andando.

domingo, 19 de junho de 2011

Amor

Estou no quase há quase muitos anos. Quase fui o primeiro da classe, quase ganhei aquela aposta, quase passei no curso que queria, quase consegui, quase conquistei, quase falei o que queria ter falado, quase fiz o que queria ter feito. Quase escrevi um texto que não falasse de amor... quase.

De tantos quases se fez minha vida que o coração já acostumou a bater convulsivamente quando me coloco um novo objetivo, que as mãos já tremem e transpiram mais do que o normal, que bato o cigarro mais vezes do que pisca uma árvore de natal no período de um minuto, que os intestínos protestam ferozmente, os olhos e os dedos e a boca ganham tíques inéditos, e os ombros travam e a coluna fica estática negando comunicação com os pés, reduzindo-me apenas à física do meu corpo que não se afasta mais que alguns poucos centímentros da região à qual atribuímos a consciência. O corpo retraído, a cabeça baixa, os olhos fundos, as vontades caladas, medo...

Quase virei ator desta vez. Foi por muito pouco, mesmo. Dizem que até o fim da vida nós sempre nos esforçaremos para quebrar a mesma pedra... sempre a mesma pedra. E grande parte desta pedra nos foi dada sem que pudessemos escolher, ainda mais para alguém com vinte e poucos anos de idade, criado embaixo de longas asas. Depois nós vamos acrescentando mais e mais matéria à nossa pedra para quebrarmos mais tarde, mas da pedra que tenho hoje eu quase nada escolhi. E ainda assim, quase a quebrei.

Dizem que no final de um ciclo sempre vem o começo de um novo... e hoje eu não falei de amor.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Pele

Hoje sonhei com uma garota, menina ou mulher. Ela tinha um poder especial: quando tocava em alguém, pele na pele, podia ler seus pensamentos. O curioso é que ela lia algumas coisas em mim quando eu a tocava que nem eu me lembrava. Outras leituras eram mais imediatas, ela lia o que eu estava pensando naquele momento, também...

Depois de alguma prática eu conversava com ela por pensamentos e, algumas coisas que vinham sem querer à minha mente eu bloqueava, parava de pensar. E funcionava, mas ela percebia que eu havia bloqueado alguma coisa porque, de repente, um pensamento sumia e ficava tudo vazio. Ela me perguntava e eu dizia que não era nada que precisasse ser falado. Acho que ela entendia bem que nem tudo precisa ser dito. Afinal, quem mais do que ela já devia ter sofrido por saber mais do que precisava saber? Acho até que ela ficou um pouco feliz e curiosa quando percebeu que não podia tirar tudo o que ela quisesse de mim. Deve ter se sentido um pouco mais humana, um pouco mais impotente, um pouco mais real.


No princípio, meu alivio foi saber que com ela eu não precisaria mentir porque ela certamente conhecia mais sobre homens e sobre pessoas do que qualquer outra mulher. Mas quando notei que começei a desenvolver certa habilidade para bloquear pensamentos percebi que até a ela eu poderia enganar. Por outro lado, vale lembrar que o que eu conseguia bloquear eram os pensamentos do momento, mas eu bem sabia que ela podia ler outras regiões da minha mente às quais nem eu tinha acesso... Isso também me excitava, assim como excitava a ela a minha habilidade de encobrir pensamentos.

Nesta relação comecei a ver uma possibilidade de ser honesto até mesmo quando mentindo. Ela saberia que eu estava ocultando algo e, assim que soubesse, ambos saberiamos que eu estava ocultando algo por ser desnecessário. E ela não perguntaria o que era, saberia que minhas intenções eram as melhores. Ela saberia também que minha fidelidade era plena, pelas regiões que lia e que eu não tinha acesso. Logo, tudo ficaria bem.

Contanto que pudessemos continuar usando a desculpa da comunicação para ficar pele na pele, não nos importavamos com a invasão dos pensamentos. Nem eu, nem ela. Aos poucos fomos nos tornando um, e ela foi ficando tão revelada para mim quanto eu para ela.

Ainda assim, tinhamos nossas zonas de sombra. Ainda assim tinhamos nossos segredos. Tinhamos a sensatez de preservar e respeitar um ao outro, pois quando todas as cartas estivessem na mesa não haveria mais justificativa para o toque. E ai teriamos que assumir que, na verdade, desde o início, era puro desejo de prazer, pura atração. Ficariamos constrangidos de nos tocar sem fazer amor.

E talvez não fosse isso que queriamos. Talvez precisassemos de mais tempo.

terça-feira, 10 de maio de 2011

F5

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Fotos, frases, desejos, devaneios, tentativas paradoxais de preencher o vazio bem no meio de um buraco negro. Eventos, convites, chamados, perguntas, contatos, trechos não vividos de vidas passantes, narrados com beleza e precisão. Às vezes não, nem isso.


F5. 0101010011000001110101010001111011010101010110000011011011101100010110101

Caneta riscando palavras, marca textos grifando frases, olhos correndo nas páginas, espiando vez ou outra, olhos correndo linhas, páginas, de tinta, de celulose, de óxido de zinco, sulfeto de zinco, substrato de vidro, cristal líquido.

Primeiros contatos de alguns. Últimos de outros, ao menos por hora. Despedidas. Buscas. Espera...

F5. 111100100101101111010101010111000101010111000


Um cigarro. Dois, três, quatro. "Ok", "desbloquear". Extensa lista curta de mais. Café, só pra ficar mais poético do que coca-cola.

F5. 01000110111010110011


Manifestações embriagadas de espectros notívagos remanescentes das últimas atualizações.

F5. 01011001

Alguém que escreve, alguém que cria, alguém que chora... e eu.

F5. 011

Alguém que espera.

O número chamado encontra-se indisponivel ou fora da area de cobertura.

Eu.

F5.

0...
0...
0...

domingo, 8 de maio de 2011

Mo(nu)mento de c(a)la(b)reza

É simplesmente uma eterna luta contra o tédio, a solidão e a miséria.

Devaneio

Levei vinte e poucos anos pra começar a entender o que é se entregar à arte. Levarei mais uns vinte e tantos para saber como fazê-la. Depois mais uns vinte e muitos para dominá-la e aperfeiçoa-la... e, se tiver sorte, não viverei os próximos vinte, para não ter que descobrir que de arte, amor e vida eu nunca soube nada.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Da menor importância.

Ele já estava nas últimas. Eu o tratava como se fosse uma frágil criaturinha, sem forçar muito contato ou relação para que não o desgastasse. A impressão que todos tinham é que ele poderia parar de respirar a qualquer momento, fugir para um mundo alheio ao nosso com passagem só de ida.

Acabou a bateria do meu celular e não acho o carregador.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Sobre o privilégio do personagem

O peronagem é livre para ser o que deseja, dizer e fazer o que quiser. Só ele pode ser o que quer sem julgamentos nem conseqüências. Ele não tem um cpf, rg ou residência para tirar satisfação. Ele existe no instante presente e nada mais, assim como o período de existência que nós deveriamos entender que temos, mas não aceitamos a finitude de algo tão superior como nós. Nós inventamos o "até amanhã".

O personagem pode ser parcial para qualquer lado que quiser, pode defender o que quiser, o que muda o caráter da mentira que o ator por trás da máscara conta para representação. A partir do momento que o argumento do ator é transferido à boca do personagem, ele passa a ser apenas mais uma visão da realidade. E esse ponto de vista é ainda mais eficiente do que se fosse dado por um ser humano. Contra o personagem nós não temos preconceitos humanos, resistências ou escudos, pois com eles não temos uma relação - como teriamos em qualquer relação humana - de interesse. Eles não vão querer nada de nós quando aquele momento chegar ao fim, nós não vamos querer nada deles quando o momento chegar ao fim, simplesmente porque eles não vão mais existir.

Falar com um personagem é como falar com alguém no leito de morte. Tudo se da ali como se fosse a última oportunidade, como se não tivessemos mais a obrigação de sustentar imagens que temos e não queriamos ter. É como contar segredos a alguém que nunca vai poder contá-los para mais ninguém.

E deixar-se tomar por um personagem implica na liberdade de deixar fluir por uma máscara quase morta aquilo que será censurado enquanto houver vida inteligente, independente da política ou das leis. O personagem, por ser todas as pessoas e nenhuma pessoa, pode ser o que ninguém se permite.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Fazer sempre a cena, qualquer que seja, acontecer.

"Pra semana que vem eu queria escolher os atores e atrizes que eu quiser para fazer as cenas que eu quiser. Não quer dizer que isso vai ser a formação final para a peça, apenas que eu quero dividir as pessoas de um modo que nós provavelmente veremos a cena acontecer."

E não é apenas disso que se trata? De fazer, dentro das inúmeras possibilidades de "como", a cena realmente acontecer?

domingo, 10 de abril de 2011

Instante

Cansei de planos mirabolantes. Cansei dos meus clichés. Cansei do perfeccionismo. Cansei de ter medo de errar. Cansei de me julgar. Cansei de não me aceitar. Cansei de pensar pra falar.

 Hoje eu só vivo. Hoje eu quero como companhia quem me acompanhar naquele dia. Hoje eu quero dia após dia.

domingo, 27 de março de 2011

- Cala a boca e faz!

- Grato pela dica...

- Disponha.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Serviço de Mesa




- Calabresa ou brócolis, senhor?
- Pode deixar que eu me sirvo, obrigado.
- De maneira alguma senhor, estou aqui para isso.
- Mas está tudo bem, mesmo. Você tem mais mesas para atender e eu sei como me servir sozinho, não precisa se preocupar.
- Senhor, é para isso que eu sou pago, para servir. Agora me passe o prato e diga o sabor, por gentileza.
(pausa)
- Rúcula.
- O senhor pediu brócolis e calabresa, senhor.
- Não, pedi rúcula.
- Mas o pedido que eu anotei não falava nada sobre rúcula... senhor.
- Você não está aqui para servir?
- Claro, senhor.
- Pois bem, agora estou pedindo um pedaço de rúcula.
- Quer uma pizza de rúcula senhor?
- Não, quero uma fatia de pizza de rúcula.
- Mas o senhor não pediu uma pizza de rúcula da qual eu possa tirar uma fatia de pizza de rúcula, senhor.
- E para que você está aqui, então?
- Para servir o senhor.
- Pois se está aqui para me servir também precisa ser capaz de fazer algo que não consigo. Trate de abrir aquela tampa e me servir um pedaço de rúcula.
- Mas senhor, isso é impossível!
- E o que é possível então?
- Um pedaço de calabresa ou brócolis, senhor.
- Sabe amarrar cadarços?
- Sei sim senhor.
- Pode amarrar para mim?
- Claro, senhor. (amarra)
- Calabresa por favor. (serve) Pode me ajudar a comer?
- A comer, senhor?
- Sim, a comer. Corte para mim.
- Pois não, senhor. (corta)
- Ah (abre a boca)
- O... senhor...
- Vamos, estou com fome! (abre mais a boca. o garçom coloca o primeiro pedaço na boca do cliente. cliente leva muito tempo mastigando e se deliciando com a pizza enquanto o garçom espera com o outro pedaço no garfo. em dado momento o garçom se cansa da espera, ele tem outras mesas que o esperam)
- O senhor não consegue comer sozinho, senhor?
- Consigo. Qual é o seu nome?
- Sérgio, senhor.
- Sérgio Senhor?
- Não. Sérgio, senhor. Mas por que o senhor precisa da minha ajuda para comer, senhor?
- Eu não preciso da sua ajuda para comer. Você está aqui para me servir e está sendo pago por isso, então quero que me alimente, só isso.
- Mas o senhor pode comer sozinho, senhor.
- Também posso pegar um pedaço de pizza e colocar no meu prato sozinho. Mais um pedaço. (abre a boca)
- (dando mais um pedaço) Mas um garçom não põe comida na boca dos clientes, senhor. As pessoas devem comer por elas mesmas.
- Desamarrou meu cadarço Sérgio Senhor.
- (amarrando-os) É Sérgio, senhor.
- (ignorando) Por que é que as pessoas devem comer por elas mesmas se elas estão pagando para serem servidas? Isso não faz sentido.
- Não senhor.
- Concorda comigo?
- Sim senhor.
- Sujei meu queixo. (sérgio pega o guardanapo do colo do cliente e limpa seu queixo. continua dando-o pedaços de pizza) Sabe, quando estava vindo para cá perdi o meu celular, será que pode me dar o seu?
- Meu celular, senhor?
- Seu sobrenome é igual ao sobrenome do seu celular?
- Meu sobrenome é Razzo, senhor.
- Nunca vi igual... o celular.
- Claro. (tira o celular do bolso e da para o cliente)
- Então não serve, minha mulher só tem Vivo. Você tem mulher?
- Está no caixa, senhor.
- A que horas ela sai do serviço?
- Está saindo agora mesmo, senhor.
- Diga a ela que se troque para viajem. Embrulhe o resto da pizza para viajem também.
- Agora mesmo, senhor. (sai para falar com a mulher. Cliente se prepara para sair, pega a carteira do bolso traseiro da calça, olha e a guarda de volta. Levanta em algum momento para esperar)
- (Sérgio volta com a mulher usando um vestido vermelho e com a pizza na mão) Acho que perdi minha carteira também. Pode pagar para mim?
- Seria um prazer, senhor.
- (passando o braço pela cintura da mulher de Sérgio) Pode incluir os dez por cento Sérgio, adorei o serviço. E fique com a pizza.
- Obrigado senhor, e volte sempre! (cliente sai com a mulher de Sérgio. Sérgio sorri cordial no centro do palco enquanto luzes diminuem)